sábado, 22 de novembro de 2008

Desenhos


sempre fui cercada de pessoas que sabiam desenhar...minha avó pouco sabia do mundo dos escritos, mas desenhava cada letra de seu nome ao assiná-lo, para não fazer feio... meu pai, de mãos rudes de fazer artes mais brutas, em ferro e madeira, sabia desenhar peixe e passarinho... seres de sua infância mineira, com os quais conviveu muito de perto... minha mãe dizia que não sabia desenhar, mas era mentira... seus desenhos, como ela, não tinham traços reais, mas possuíam uma estética infantil, que não era menos verdadeira, nem menos bela... minha irmã desenhava de tudo, fisionomias de cabeça com as expressões que guardava na memória, seres estilizados que dançavam em roda, imagens que queria ter vivido, traços encadeados... meu irmão desenhava a perfeição, cavalos, cachorros, mulheres, tudo perfeito, com movimentos técnicos... eu desenhava cópias, observava e tentava imitar... as letras da minha avó, os peixes e pássaros do meu pai, as bonecas e casinhas da minha mãe, os traços livres da minha irmã, o tecnicismo do meu irmão... meu amigo querido, esse eu já tinha esquecido que desenhava, só tinha na memória uma vaga idéia de que já vira desenhos dele, mas não sabia se era realidade ou imaginação... já recebi muitos desenhos que não guardei, pessoas especiais que eu perdi sem querer em alguma gaveta... os que vieram depois de mim também desenham bem.... minha filha, quando pequena, não desenhava gente, só paisagens, hoje é ela que faz os cartazes dos trabalhos de grupo da escola... meu filho, quando bebê novinho, fechava linhas em círculos, adiantando-se ao seu tempo, hoje já pinta dentro das linhas e gosta de desenhar carros, famílias e casas... meus amigos e filhos eu não copio, mas admiro... absorvo, me transformo... os entendo através dos desenhos... os meus verdadeiros traços são sempre linhas perdidas que se emaranham... não têm começo, partem de qualquer lugar e nunca sei onde vão terminar... começam, às vezes, curvos, terminam retos... ou ao contrário, tanto faz... vão se amontoando e se completando até tomar todo o papel... às vezes têm olhos, bocas... mas nunca têm rostos inteiros... já fiz muito desenhos em linhas simples, quase contornos, para montar alfabetários, ajudar meus alunos a entender as letras e seus sons... é muito mais fácil ler desenhos do que letras... existem pessoas que vêem significados nos desenhos... compreendem a alma das pessoas através deles... deve ser verdade... minha alma, eu não sei onde começa, nem termina... e já quis tanto ser igual... mas por qualquer motivo me embaralho e me espalho pela superfície lisa que bem poderia ser a de um papel... mas me mostro com muita facilidade em contornos de linhas simples... hoje, minha vida se desenha em labirintos, perlês de confeitar bolo e bordar tecidos... com uma necessidade imensa de preencher os espaços vazios... meu desenho ainda é incompleto e sempre o será enquanto ainda houver papel e detalhes minuciosos para completar... enquanto ainda houver grafite... até a mão não ser mais firme... enquanto houver alma pra desenhar...
(Ana)


Imperícia; falta de talento, falta de segurança. Nunca fui boa em desenhos, nem mesmo na escola. Lembro da recuperação na sétima série, na matéria DESENHO. Se na mão falta habilidade para desenhar, imagina segurar um compasso e fazer dele uma extensão de minha mente.Não daria certo mesmo. Mas juntamente com o sonho de bailarina que não sentia dor, existia e ainda existe o sonho de desenhar, de colocar no papel o que minha arte deseja. Poder perpetuar meus pensamentos e minhas cores. Não é falta de amor ao desenho não, minhas telas a óleo mostram isto, se gosto de pintar, todos acabam achando que sei desenhar. Minha poesia cabe nas cores, mas não nos traços que tento com eles expressar.Garatujas, não passam de garatujas. Pra fazer um quadro mais elaborado, tinha a folha de papel vegetal, papel carbono verde e xerox ampliado. Sabe o papel quadriculado? Nem com ele conseguia copiar nada. Nunca, nem uma casa, nem um barco, nem uma árvore, nem um passarinho e nem uma borboleta dentuça como as da minha filha. A tartaruga que bebe água com a língua pra fora. Nada disto, saiu de dentro das articulações da mão, coordenação motora, pra desenho, nenhuma. As aulas lá na escola técnica de publicidade do Rio, foram testemunhas do suor que escorria da face, não pelo calor do verão do Rio de Janeiro, mas pela inabilidade de colocar no papel a luz e a sombra do desenho que tinha que reproduzir!Quanto orgulho do meu equipamento de nanquim emprestado pela tia Arquiteta, minha pasta A4, meus lápis, mas na hora de usá-los o sofrimento de produzir algo medíocre.Já pensei em fazer um curso, já vi até o preço, mas é como cantar, outro sonho de criança. Pra conquistá-los vou ter que me expor na frente de outros. E aí, emperra.Posso mostrar-me aqui, nas palavras, nos sentimentos e na verdade que saí do coração, mas estou só. Só como nasci e como vivi, a minha arte nasce da solidão, da música que toca dentro de mim.Meus borrões! Guardo pra mim, dentro da caixinha destinadas a eles. Caixinha tão bem guardada que nem sei onde ela está e ainda não consegui procurá-la. Nanquim, carvão, lápis de cor, hidrocor, guache, tinta óleo, acrílica, todas vão morar em mim e peço a vocês, deixe-me usá-las só nas letras e no que meu coração insiste em sentir.Desenhar, quem sabe um dia, assim como cantar!

(Aline)

Eu gostava de desenhar. Talvez fizesse isso bem, ou talvez convencesse pela insistência. Eu particularmente nunca achei meus desenhos bons, mas isso não importa. Cada cantinho de papel vazio ganhava mesmo sem pedir um desenho, assim lá estavam, com tinta de caneta esferográfica, os colegas de turma, os professores, figuras de braços enormes, contorcidas como se fossem de borracha. olhos e espirais intermináveis. Meu filho faz o mesmo, somos, pelo visto, dois sonhadores desatentos.
“Faz o aí o rosto do Papa, o D. Pedro I, o homem das cavernas! Não diga que não sabe, sua tia pediu, você rabisca o tempo todo, na hora que precisa é essa má vontade...” É, tinha o lado ruim também, mas acho que não foi por isso que parei de desenhar, fui perdendo a vontade e a necessidade de fazer. Fui perdendo também o tempo ocioso ao lado de papéis e lápis, não somos mais tão íntimos.
Hoje aprecio os espaços vazios. Até para escrever uso poucas palavras, faço com elas um contorno para o silêncio e só. Por isso demoro tanto a atualizar esse blog...se ficasse por conta das meninas teríamos quase todos os dias bons textos.
(Neysi)

3 comentários:

Anônimo disse...

Adoro você e seu traço elegante, suas palavras poucas e precisas...irmã e prima, vocês são ótimas
Beijo
Manuel

Anônimo disse...

Acho que nossos textos são bons, mas eles passam a ser completos, quando estão unidos como aqui no blog.

Neysi disse...

São estilos diferentes, visões diferentes. mas tem um inegável núcleo comum...mas admito, vocês estão mandando muito bem, eu só dou uns palpites-rs