sábado, 8 de novembro de 2008

plantas, bichos, gentes



cresci num universo vivo... vivo em todos os sentidos, em todas as nuances... vivo porque vivido, vivenciado, experimentado com emoções, sensações, descobertas vivas... reais, sobrenaturais, intensas... cercada de seres vivos... plantas, bichos, gentes... lembro de mim sentada em um dos três degraus que davam da varanda para o corredor que levava ao quintal... um corredor repleto de plantas e um balanço... quase não havia espaço pra passar... sentava ali pra ver filas de formigas passando... pra cavucar a terra procurando minhocas... pra revirar as folhas tentando achar caramujos, caracóis... pra fugir da tartaruga que mordia calcanhares... pra observar os marimbondos fazendo casa na beirada do telhado.... pra observar as folhas que as lagartas comiam o verde pelo meio e deixavam apenas uma fina película no lugar... pra encontrar casulos nas finas folhas das palmeirinhas... pra ver os lírios nascerem... os lírios... passavam horas para descolarem as pétalas... iam se soltando uma das outras lentamente... às vezes não conseguia esperar... dava uma ajudinha com a pontinha do dedo... bastava uma pequena pressão e elas se abriam todas... doce aroma emanado... como uma florzinha tão pequena tinha um perfume tão forte e bom... muitos anos mais tarde, aprendi que as flores brancas, normalmente, abrem à noite e têm um perfume mais intenso, pra chamar a atenção dos parceiros que vão ajudar na sua fecundação, já que no escuro, flores sem perfume não atrairiam os insetos, cores chamativas também não fariam diferença, até mesmo por isso que são brancas, pra se realçarem à noite... depois disso entendi porque elas demoravam tanto a abrir, começavam de dia, mas só deveriam terminar de abrir à noite, pra liberar todo o seu perfume e chamar os insetinhos... e eu, já naquela época ansiosa, abreviava o tempo da floração e atrapalhava a fertilização das pobres coitadas... rs... só pra ver o espetáculo delas abrindo... só pra sentir o seu perfume... havia outras plantas... plantas que se ficassem no sol ficavam verdes, se ficassem na sombra ficavam roxas... plantas que tinham nome bonito, brinco de princesa, imaginava se uma princesa teria mesmo o capricho de fazer das belas flores seus brincos... alfinete, que espetava... jibóia, que crescia na água e na terra... a que vivia na água tinha um peixinho nadando dentro de seu vaso... idéias de meu pai pra não dar larva de mosquito... e nem era tempo de dengue ainda... renda portuguesa, pipa, azaléia (nome de sandália), espada de são jorge e a temível... comigo-ninguém-pode... que dava medo até de encostar a mão, senão morria... tinha também mais bicho, coelho, sapo criado desde girino, pintinho, gata que foi entrando e ficou morando na casa, cachorro, hamster, periquito, passarinho, peixinho dourado, peixinho de rio... cresci no meio da vida em floração, em atividade, em desenvolvimento... nascimento, vida e morte... mas cresci e não aprendi a cuidar de planta, sempre deixo morrer... nem de bicho, não dou o carinho devido... teve época que isso me assustou... pensei comigo mesma, se não sei cuidar de um ser vivo, como poderei ter filhos?... graças a deus, quando tive filhos, eles não morreram de sede, nem lhes faltou carinho... a natureza é sábia e apesar da minha falta de jeito com os demais seres vivos, me fez boa mãe... eu acho, né?... mas só eles vão poder dizer no futuro... instinto talvez... a força da natureza que comanda todas as coisas... a mesma força que fazem os lírios brancos abrirem à noite, perfumados
(Ana)


É um tema que há muitos anos era difícil pra mim. Não que não gostasse de plantas e bichos, eu realmente gostava. Mas, não sabia cuidar deles. As plantinhas eu afogava ou matava de sede, os bichinhos eu não tinha paciência. Na verdade gostava de brincar com eles, mas não gostava de limpar a sujeira que eles faziam.
Eu era uma criança. Criança gosta de bichos como se fossem seus amiguinhos, e amiguinhos não tem que limpar o cocô uns dos outros. As plantas foram motivos de várias experiências, eu pegava todos os produtos de limpeza, uma seringa com agulha e injetava as minhas invenções nelas, acreditava que eu ia descobrir a fórmula para elas crescerem, e seria como meu pé de feijão. Sorte é que elas resistiram as minhas investidas.
O peixinho do Sergio, eu quis segurá-lo pra sentir como era ter algo vivo nas mãos, mas não sabia que tirando ele da água, ele se debateria e morreria, e foi o que aconteceu, se debateu nas minhas pequenas mãos e caiu no chão. O susto foi grande e corri de medo, e o medo maior era da bronca de matar o peixinho que era do meu primo, corri e coloquei o peixinho dourado de volta, já sem vida no aquário.
Fui crescendo e pensando, como será minha vida, não consigo manter minhas plantas vivas, como será com um filho? E a ordem se inverteu, tive a filha e aprendi a cuidar não só dela, mas como de mim, das plantas e até dos bichinhos.
Eu cresci, agora já sei cuidar!
Vieram os peixes, as plantas e o cão. Tenho vaso com sete ervas na porta de casa, pra proteger, cheflera, árvore da felicidade, cactos, jabuticabeira, lírios da paz e outras que nem sei o nome. Todas estão vivas!
E meu cão, Timmy Turner, um cocker part color, muito lindo, meigo, carinhoso, amigo, companheirão, ele hoje é o primeiro a ser atendido nas suas necessidades, limpar a sujeira, trocar a água, dar comida, lavar seu quintal. Uma rotina que não me cansa, pois este cãozinho que mais parece um filho meu, faz a diferença nas nossas vidas, minha, da minha filha e do meu marido. Uma casa sem plantas, sem animaizinhos, parece não ter vida!
A vida foi se fazendo aos poucos dentro de mim. Cresci vendo minha família toda amar as plantas e a conversar sobre elas, e pedir uma mudinha de planta, quando gostava da plantinha e ainda não tinha nenhuma daquela espécie; cresci sabendo que as plantas também sentiam o nosso ambiente, que uma pessoa com "olho gordo" poderia matar uma plantinha que chamasse atenção, mas que isto deveria ser visto como coisa boa, porque aquela energia ruim, não nos atingiu, a natureza havia capturado esta energia, filtrado algo ruim.
A natureza se faz tão presente nas nossas vidas, que hoje escolhi viver perto dela, aqui no pé da serra onde eu moro cercada por árvores, por natureza, posso admirar as lagartas peludas subindo pela parede, as minhocas na terra viva das plantas, os tatus-bola que minha filha insiste em capturar, a vida, o sol que nasce e que se põe, o galo que canta logo cedo, os pássaros. Aprendi que na vida o que importa é o natural, aquilo que se movimenta no ritmo do mundo que nos cerca, e só observando este mundo e nos conhecendo, podemos sentir que realmente estamos vivos!
(Aline)




Uma bola de pelos arrepiados amarrada com um laço cor de rosa. Umas trezentas gramas, não muito mais. Joana trouxe a gata já pronta para cair no choro se alguém recusasse a hóspede. E o que adianta falar do cachorro enorme e estabanado que com uma focinhada pode esmagar a coitada? Ela é assim porque a mãe não lambeu, a veterinária é que falou, senão teria o pelo lisinho igual aos outros gatos, eu já comprei ração, areia , brinquedo, ela pode ficar, não pode? Ficou, e agora faz companhia ao casal de periquitos, não demora está brincando com o cachorro também.
Eu achava que cuidar de bichos era muito trabalhoso, mas cuidar de gente é que é. Olho para as crianças crescendo e sinto medo, o que vai acontecer com essas pessoinhas que eu trouxe para o mundo, o que elas esperam da vida e o que a vida espera delas? Juca fez a barba, Joana tem um pretendente. Precisam roupas novas, o tênis já não cabe. Precisam estudar, aprender profissão, fazer escolhas difíceis que eu não tenho como ajudar. Gente dá muito trabalho.
Enquanto isso o jasmineiro abre suas flores brancas, os copos de leite disputam espaço com as hortênsias e o cachorro estabanado, numa corrida, passa por cima de tudo.

(Neysi)

2 comentários:

Anônimo disse...

ai que bom ter, gente, bichoes e plantas em nossas vidas. Gostou muito de tudo isto!
Me sinto viva com os meus iguais!
Aline

Unknown disse...

Que lindo, Neysi! Gostei mesmo!